O 8º ecossistema mais rico do planeta ocupa um território de 590 quilômetros de extensão, resguarda 5% da flora mundial e é responsável por abastecer com recursos hídricos cerca de 14 milhões de pessoas diariamente. Localizado entre os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, a Serra da Mantiqueira, parte do bioma da Mata Atlântica, um dos mais importantes do mundo, entrou em colapso deixando milhões de pessoas sem ou com pouco acesso à água entre 2014 e 2015. Nesta terça-feira, dia 12, o Sistema Cantareira, um dos reservatórios que recebe recursos hídricos da cordilheira chegou a um nível de 35,4% de sua capacidade, nível inferior ao mesmo período de 2013, ano que antecedeu a crise hídrica.
De acordo com José Roberto Manna, coordenador técnico do projeto Águas da Mantiqueira, a situação pode mais uma vez se tornar preocupante, de modo que parte do desabastecimento hídrico acontece por conta do desmatamento de áreas naturais. “O topo de morro é a caixa da água. A vegetação natural funciona como uma embalagem e é um dos pontos que a água da chuva penetra com mais facilidade no solo. Isto que mantém os lençóis freáticos, que por sua vez, formam nascentes e rios. É fundamental preservar os topos de morro que comumente chamamos de áreas de recarga”, reforça o consultor técnico da FUNDEPAG (Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio).
O consultor avalia que é preciso equilibrar a gestão da demanda com a da oferta de água, combinando obras de engenharia verde para o fornecimento de água, para a despoluição das bacias hidrográficas e para a redução das perdas físicas no sistema de água de Santo Antônio do Pinhal. Estas chegam a mais de 40%, aliadas a alternativas não menos importantes, as Soluções baseadas na Natureza (SbN). “É necessária uma infraestrutura adequada para as cidades serem abastecidas devidamente. Mas especialistas têm concordado que as Soluções baseadas na Natureza são extremamente efetivas para lidar com problemas urgentes, além de serem o caminho do desenvolvimento econômico compatíveis com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS, estabelecida pela ONU.” Essas e outras diretrizes fazem parte do projeto Águas da Mantiqueira, iniciativa realizada pela Fundação Toyota do Brasil em parceria com a FUNDEPAG.
A ação realizada em Santo Antônio do Pinhal, interior de São Paulo, resultou em um estudo, entregue ao poder público no fim de agosto. Após 15 meses de trabalho de 30 pesquisadores foram avaliadas características de cada uma das 10 bacias hidrográficas da região, sua flora, fauna construções em área urbanas e rurais, situação de esgotamento sanitário, educação, entre outros temas. Os direcionamentos poderão ser utilizados pela prefeitura para elaborar um planejamento territorial do município que seja compatível com o desenvolvimento socioeconômico sem descartar o impacto no meio ambiente, que oferece uma série de serviços aos seres humanos.
A importância econômica dos serviços ambientais
Plantas e animais silvestres trabalham em suas funções de vida e proveem aos seres humanos com este trabalho um capital natural sobre o qual construímos os sistemas econômicos. Sem as abelhas, poderíamos, por exemplo, polinizar plantas, mas o custo dos alimentos aumentaria exponencialmente, assim como filtrar água e conter a erosão – serviços muito onerosos.
Uma estimativa de referência de valor deste capital foi publicada em uma das mais importantes revistas científicas, a Nature, em 1997. Naquele ano, o Produto Nacional Bruto de todas as nações somadas atingiu 18 trilhões de dólares. No mesmo período, os serviços ambientais em 17 biomas do mundo totalizaram 33 trilhões de dólares, ou seja, o capital natural que permitiu a riqueza produzida foi quase o dobro.
“O valor econômico da biodiversidade é o maior lastro para convencer o mundo moderno a sua proteção”, defende Manna. Junto a essa questão o presidente da Fundação Toyota do Brasil, Percival Maiante, afirma que a educação é um dos principais meios para reverter a situação. “O objetivo de construir um planeta realmente mais sustentável, por necessidade, passa por investimentos em educação para a sustentabilidade. É nisso que todos devemos focar se nos interessarmos pelo futuro das próximas gerações”, relata Maiante.
Diretrizes para a conservação dos recursos hídricos
Atualmente, no município de Santo Antônio do Pinhal, a concessionária dos serviços de água coleta apenas 45% de todo o esgoto produzido na área urbana e, embora o tratamento seja de 100% do esgoto coletado, a eficiência desse tratamento é de 55%. Isso significa que mais da metade dos esgotos tem sido despejada sem tratamento no Rio da Prata comprometendo a qualidade dos recursos hídricos e o equilíbrio do ecossistema aquático como reportado nos últimos relatórios elaborados pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). Por essa razão, o projeto ressalta a importância de coletar 100% do esgoto gerado nas áreas urbanas, e tratá-lo com a eficiência de no mínimo de 80%, conforme legislação.
Nas residências localizadas nas áreas urbanas e rurais que não possam ser atendidas pela rede coletora de esgotos devem ser instalados esgotamento sanitário e fossas sépticas – maneira simples e barata de disposição dos esgotos indicada, sobretudo, para a zona rural ou residências isoladas -, para evitar a contaminação das águas superficiais e subterrâneas e a disseminação de doenças de veiculação hídrica.
Além disso, é necessário melhorar a infraestrutura. O índice de perdas do sistema de distribuição de água do município de Santo Antônio do Pinhal é superior a 40%, demonstrando um alto desperdício de água tratada. Assim, são necessárias a implantação e a efetiva execução, por parte da empresa responsável pelo abastecimento do município, de um programa contínuo de monitoramento e de combate a perdas no sistema de distribuição de água tratada.
Outro direcionamento do projeto Águas da Mantiqueira é aprovação de Lei Municipal que institua uma política de proteção aos mananciais de água destinados ao abastecimento público. “Normalmente, tais leis visam proteger e/ou recuperar os mananciais de interesse do Município, assegurando quantidade e qualidade de água adequadas ao abastecimento da população atual e futura, e adequando programas e políticas de ordenamento territorial, considerando parcelamento do solo, instalação de indústrias, ampliação da malha viária e outras de forma compatível à proteção dos recursos hídricos”, considera Carolina Bozetti, responsável pelo capítulo de Recursos Hídricos do projeto Águas da Mantiqueira.
É orientado também que o poder público busque parcerias com órgãos e instituições atuantes na área de extensão rural que possam auxiliar os produtores rurais na adoção de técnicas produtivas apropriadas às condições locais e que garantam maior proteção aos recursos hídricos, incentivando técnicas de preparo e cultivo dos solos (como, por exemplo, o cultivo mínimo e o plantio direto) e sistemas mais eficientes de irrigação e inscrição de todas as propriedades.
“Os sistemas agrícolas convencionais esterilizam o solo. Eu uso a associação natural das espécies como força motriz para gerar fertilidade nesse solo”, explica André Cerveny, agricultor agroflorestal, uma das alternativas sustentáveis à agricultura convencional.
Do ponto de vista dos recursos hídricos, também é importante que os proprietários rurais sejam incentivados a proteger os remanescentes de vegetação natural presentes em suas propriedades e, na ausência das matas ciliares ao redor de rios, riachos e nascentes, que os proprietários sejam motivados a restaurá-las.
No Sítio Aconchego, em Santo Antônio do Pinhal, onde o rebanho de gado Jersey produz cerca de 130 litros de leite diariamente, a região foi restaurada pelo fundador da empresa de pecuária que hoje é administrada ali. Heinz Thielemann não deixou de lado a lucratividade com a restauração ambiental do seu terreno. “Eu acredito muito na importância da preservação ambiental aliado ao desenvolvimento econômico sustentável. É possível ter um local saudável econômica e ambientalmente”, explica Thielemann.
Já na propriedade Sítio Verde, o tecelão Dioclésio natural de Santa Catarina ficou perplexo com a degradação da propriedade que tinha acabado de adquirir, em 2007, com a esposa fluminense Miriam. O amor pela natureza foi tanto, que o tecelão restaurou os 24 hectares de sua propriedade que era uma antiga lavoura e área de pecuária. “A natureza selvagem não é importante, é imprescindível”, relata Dioclesio. O artesão retirou as plantas exóticas da propriedade, limpou e restaurou o solo de forma adequada. O resultado foi a regeneração natural gradativa do local.
O instrumento educacional
Os impactos ambientais decorrentes dos atuais padrões de produção e consumo têm trazido a educação para o centro da agenda de debates chamando a atenção de todos acerca da necessidade de se refletir sobre o papel da escola e outras instituições que, por ventura, tenham a capacidade e o propósito de intervir nos processos formativos, despertando a atenção de crianças e jovens para os problemas e os desafios do século XXI.
Os serviços prestados pelas inúmeras espécies vivas que integram o domínio da Mata Atlântica com diferentes fisionomias da vegetação e fauna associada na Serra da Mantiqueira, além de se comportarem como sistemas inteligentes e sustentáveis, precisam ser disseminados e incorporados pelos professores, estudantes, pais e a comunidade escolar que interagem e vivem nesses espaços.
O ambiente produzido pela recente construção da Base Nacional Curricular Comum abre uma janela de oportunidade para que as redes de ensino da Mantiqueira possam estruturar os currículos em consonância com os desafios da realidade local, as expectativas e os projetos de vida dos alunos os quais se encontram inseridos num contexto de vida muito singular.
Numa perspectiva educacional mais ampla, os projetos pedagógicos das escolas, como também o de outras agências e instituições com propósitos educativos nos municípios da Mantiqueira, devem guardar algumas diretrizes e objetivos como: compreensão ambiental do local onde a população está inserida, estimulo a construção de valores, comportamentos e consumos coniventes para uma vida sustentável na Mantiqueira, envolvimento e apoio da população na melhoria da gestão da água.
“É de fundamental importância que a população, em especial as crianças, compreendam o local em que elas vivem. Criem um poder de pertencimento, respeitem e cuidem do local onde estão inderidas. Só assim poderão de fato valorizar aquilo faz parte do cotidiano delas”, enfatiza João Roberto de Souza, educador e responsável pelo capítulo de Educação do projeto Águas da Mantiqueira.
Curiosidades da Serra da Mantiqueira
– A Serra da Mantiqueira é uma cordilheira que abrange 3 estados: São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro;
– Mantiqueira é um termo de origem Tupi-Guarani “Amantikir”. “Amana” significa chuva e “tiqueira”, gotejar. Montanha que chora ou serra que chora;
– A Serra da Mantiqueira tem muitas bacias hidrográficas, 10 estão em Santo Antônio do Pinhal;
– O município possui 3 fontes de água mineral públicas e acessíveis à comunidade;
– Com aproximadamente 500 quilômetros de extensão, seu ponto mais alto é a Pedra da Mina, com 2.798 metros, na divisa de Minas Gerais e São Paulo.
Sobre a Fundação Toyota do Brasil
Criada em abril de 2009, a Fundação Toyota do Brasil atua na preservação ambiental e formação de cidadãos. Além das novas iniciativas surgidas com a sua instituição, a Fundação Toyota do Brasil unificou e ampliou todos os projetos de responsabilidade social em andamento, que estavam sob a responsabilidade da montadora Toyota do Brasil.
Nacionalmente, além do Projeto Arara Azul , a Fundação Toyota do Brasil patrocina desde 2009 o Projeto Toyota APA Costa dos Corais, em parceria com a Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), do governo federal. O projeto prioriza a conservação dos recifes de corais e ecossistemas associados ao peixe-boi marinho em uma área de 413 mil hectares nos estados de Alagoas e Pernambuco.
Localmente, a entidade agrega ainda as ações sociais implantadas e mantidas nas comunidades onde a empresa possui unidades, como Indaiatuba (SP), Guaíba (RS), Porto Feliz (SP), Sorocaba (SP) e São Bernardo do Campo (SP). As iniciativas compreendem as áreas de educação, meio ambiente e cultura, e contam com o apoio dos colaboradores da empresa como voluntários.
Para mais informações, visite o site da Fundação Toyota do Brasil na internet www.fundacaotoyotadobrasil.org.br.
Sobre a Fundepag
A Fundepag (Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio) é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos, estabelecida em 1978 por grupos empresariais, representantes da agropecuária, da indústria, do comércio e das finanças. A entidade tem como objetivo viabilizar projetos de pesquisa, desenvolvimento científico e tecnológico no Brasil.
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